sábado, outubro 29

Chapéus Peludos ou Moicanos Azuis - III

Uma janela grande. Tenho uma janela grande no sitio onde moro, e a minha secretária de frente para a janela. A cama no meio do quarto, sem apoio de uma parede para dormir.Tenho uma janela grande, que dá para àrvores, esquilos e pássaros; e as gotas de chuva, que acompanham os post-its na janela são coisinhas pequenas que escrevem palavras estranhas nos vidros, como as rabiscadas em papéis amarelos. Da minha cozinha vê-se a cidade, e a distância convida a chás e conversas sem sair à rua. Gente diferente de sitios diferentes, com tanto para ensinar, cheiros e maneiras e homens de vidas á sua maneira, entram na minha vida, e nem sequer saio de casa. Pensar que algures comer migas é nojento ou que andar de mão dada na rua é crime. Mas ler isto nos olhos de quem vê cidades pela primeira vez, é como pisar terras e sabores distantes, numa partilha de torradas e conceitos de outra lingua. Quem diria que pensar matemática é diferente noutra lingua, ou que voltar á das primeiras palavras (mãe?) é tão automático como praguejar numa panela quente...
Estou mais perto do mundo, embora tenha de optar todas as manhãs entre o autocarro (quantas vezes sonhei andar num vermelhão de dois andares como os dos meus briquedos de mais pequeno...) e dois terços de hora pelas ruas castiças de lojas de bairro... Gosto tanto de andar, e agora ainda gosto mais de andar; porque ando mais, e porque na distância está um sonho no meio da selva (pulos de alegria na mera hipótese "Talvez possas...", Indonésia daqui a dois anos, treino intensivo e procurar bichos que nunca nenhum homem viu), e há que estar pronto...
Na viagem de regresso a casa (escada de carcol para o primeiro andar...), as casas alinhadas na rua, victorianamente iguais mas cada uma diferente, espelham os meus olhos a saber um botão como o primeiro gesto depois de abrir a porta e contornar a cama (ilha de lençois no centro do espaço, o edredon carrgado na mala quase faz dela a minha). Acho que o que quero dizer é obrigado pelas figas.

Barnabé Santiago
29/10/2005

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Seria desconfortável não ter as figas, é um movimento que fazemos já naturalmente, mas não vulgarmente, por aqueles a quem queremos bem (eu hoje devo achar que tenho muita moralidade para falar de mim como um nós, mas ter-me em vista só mim ficava mal.)
O texto, está sublime. A prepósito da palavra, sim o blog post secret tem "uma linguagem" especial.
É bom ter notícias tuas, saber dessas janelas!
Beijo grande

domingo, outubro 30, 2005 1:20:00 da manhã  
Blogger Meriel said...

Barbas,
Já respondi no Castelo, mas repito:
parabéns pelo quarto novo, tão cheio de janelas. Janelas essas que tão generosamente abres para nós enquanto as abres para ti próprio e para o mundo.
Mais uma vez a tua crónica de viagem transportou-me para um cantinho do teu novo mundo e principalmente das tuas novas vivências. Acredito que quando partires daí será para uma nova e ainda maior aventura.
beijos

quinta-feira, novembro 03, 2005 11:11:00 da tarde  

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