sábado, abril 11

“Yantra que a porta está aberta!”

Tantas folhas brancas por escrever.
E tanto com que enchê-las.
Sobretudo com o loop imenso
de que de nada vale escrevê-las.
De nada é o esforço
de pôr cá para fora os demónios e os arcanjos.
Se está tudo na mente.
Se ainda que o papel exista
e as letras desenroladas
são só cheias de cabeças e ideias.
São só coisas na nossa mente.
Artefactos a esconder a verdade do silêncio.
Mais charadas e joguinhos
para distrair do medo.
Do medo de não ser.
Morte.
Silêncio.
O tudo transformado no nada que é.

Reparo nas linhas que escrevo

como quem sonha acordado que é altura de dizer algo.

Acontecem e eu vejo a folha branca a encher-se.

Lembro-me que estou a fugir do Inominável.

E enquanto me lembro,

e até enquanto analiso isso,

permaneço no ciclo vicioso dessa ilusão.

Sou.

Isso pareço saber.

Sou o Outro.

Tudo em minha volta é outro.

Ou assim aparenta a comédia da viagem.

Aqui, ao contrário da lógica a que me acostumei,

acordo para um mundo

que parece acontecer do lado de fora.

Separo os detalhes da minha experiência

em pensamentos que

as transformam em coisas.

E quando interajo com elas,

as aparentes coisas,

resultados emergem.

Mas é tudo uma coisa só.

Um campo único vibrando em existir.

E os meus sentidos dão-me perspectiva disso.

Será que é isso que eu sou?

Uma perspectiva?

Mas sou tantas.

Sou.

E habito perspectivas.

Tantas quanto eu imagino.

Sou.

E imaginar o que é?

A cada pergunta a confusão desvanece.


Sou.


Há uma paz no silêncio.

Em tudo o que não se pode nomear.

Em todas as equações

feitas na mente de um louco,

com variáveis

que não se tentam sequer definir.

Há mais saber nelas que em todas as letras do mundo.

A única arte que realmente vale é Ser.

E Ser é Arte.


Penso em todas os seres

que parecem partilhar a experiência.

Em cada um deles Deus.

Em cada um deles Arte.

Os piores e os melhores.

Os vilões e os heróis.

Todos filhos, muitos pais.

Todos perspectivas de Tempo a Agir.


A agonia de não valer a pena volta a invadir-me.

De que vale tentar pôr num pedaço de fibra

pequenos filamentos de carbono

representando o segredo do Universo

ainda que o soubesse?

A mim parece-me

ser tudo

uma grande pilha de Merda.

Nada senão viver vale a pena.

Isso ou suícidio

que é um grande desperdicio

de Tempo.

Viver. Ser.

São coisas diferentes.

Sinto que Ser

é algo maior

que o meu corpo

ou quem sou

ou os circuitos

do meu cérebro.

Ser é.

Com um é que se conjuga

fora do Tempo.

Ser como o tecido básico de tudo.

Viver é algo Outro.

Viver é crescer,

evoluir com vontade,

processar e manifestar realidade,

ou desistir de tudo

e descer ao abismo da matéria.

Viver é o que se faz

com a experiência

depois de se perceber

que nada perceberemos

sobre Ser.

Viver é por as mãos na Merda

e sorrir olhando os padrões.


Sorrio.

Olho os desenhos na página branca

e sei que os macacos vão nele encontrar sentido

durante um tempo.

Já sei o que quero Ser

quando for grande.

Esculptor de Merda.


Barnabé Santiago 11/04/2009