segunda-feira, setembro 26

Chapéus Peludos ou Moicanos Azuis? I

Há quem apanhe mocas com álcool, há quem prefira substâncias de legalidade duvidosa, a mim basta-me a moca de sono com que acordo todos os dias. E logo na última vez em que a minha mãe me vai acordar á cama é que a moca me havia de dar para a sinceridade. ”Já são cinco e dez…” “Tu não me digas que horas são! Eu sei! Eu sei tudo…” então acordei, dei-lhe uma festinha e ela percebeu que eu nem me estava a sentir. Levanto-me da cama estremunhado e olho a cumplicidade do quarto em volta, enquanto ouço na minha cabeça os acordes simples do inicio de Exit Song(For a Film) dos Radiohead “”Wake from your sleep and dry on your tears … Pack and get dressed … Breathe, keep breathing, don’t lose your nerve”.
Sinto o quarto como um lugar estranho. Não estranho de não o conhecer, nem estranho de algo que o torne estranho. Estranho é que não leve o meu quarto comigo (será muito dinheiro de excesso de peso?). Estranho é que longe de mim o exista o caos aparente de um lugar tão meu. Que deixe de partilhar com estas paredes as minhas lágrimas e os meus sorrisos. Que a minha pilha de livros continue ali, no chão ao pé da estante do que sou.
Olho a minha casa e sei que será sempre a minha casa. Os meus irmãos dormem num quarto que já foi o meu, e cada canto continua a ser cada canto.
As malas na bagageira e ruas que conheço tão bem. Sinto-me um puto a caminho da escola, pequenino no banco de trás; é o que sou.
É madrugada sobre Lisboa e pela primeira vez na vida (a sério!) sinto verdadeira frustração de não ser maior, por duas semanas ainda precisei que o papá e a mamã rabiscassem sobre o joelho a minha autorização de ida.
Check in no último minuto, os tipos da frente numa surf trip que os levaria a um qualquer lugar onde o calçado foi esquecido, com três escalas pelo caminho, e o choradinho do costume com as pranchas “Vês mãe, quando me pagares uma surf trip vai ser assim…”. A hospedeira que implicou com a foto sem barba no BI a perguntar “ Então fazem o Visto á chegada?” “Qual Visto?” O tipo mais baixinho, de havaianas amarelas e mochila NorthFace, tem todo o ar de quem se está nas tintas para ver ou deixar de ser visto, ele vai sair calmamente do aeroporto com a 6’4” debaixo do braço, alugar um carro e seguir para o spot mais próximo, mar perfeito sem crowd num raio de 10Km. No canto do meu sorriso há uma ponta de inveja (lá chegará o meu tempo), enquanto a hospedeira explica detalhadamente à plateia distraída todos os passos burocráticos que eles com toda a certeza vão saltar.
Em jeito de conselho: quando quiserem viajar sugiro que não tenham barba, botas de montanha, uma t-shirt vermelha com slogan duvidoso (powder for the people) e um livro de Nietzche na mão. Na verdade até as botas, nas quais guardo dois terços do dinheiro (um terço em cada uma) que trago tem de saltar para passarem por raio-x (será que os sorrisos do tipo da máquina querem dizer que o dinheiro apareceu no ecrã?...).
As recomendações que ninguém ouve passam no ecrã e eu farto-me de procurar mas não vejo uma única hospedeira com argumentos que honrem a Lenda da hospedeira, os tempos já não são o que eram. Enquanto sobrevoamos o atlântico olho pela janela, a executiva sentada ao meu lado puxou o seu i-mac de para cima de uma fortuna e a trepidação da asa lembra-me que vou montado num molho de pedaços de ferro pregados com rebites, é surreal, especialmente porque estou a 11000 metros e viajo a 900 km/h.
Á chegada a Heathrow sei exactamente como me vou sentir nessa noite. Há malas que ninguém vem buscar e andam em volta, sempre na fé de que alguém lhes deite a mão. Uma mala com ar de já ter dado ter voltas ao mundo conhecido e ter mais aeroportos no bolso que qualquer popstar passa por mim. Mr Sakamoto, reza a etiqueta, nem esperava outra coisa, se dissesse Jonh Doe ou José Silva não estranharia. Fui o primeiro a chegar ao pé da ruiva com riso histérico que segura uma folha: Cardiff University e em Galês: qualquer coisa Caerdydd, como se algum estudante estrangeiro soubesse galês…
Ofereci-me para segurar a folha, já é costume os meus compadecimentos darem em frete… A próxima a chegar é uma tuga que mora nos Estados Unidos e vem fazer mestrado em ordenamento do território. Será normal que não perceba patavina do que a ruiva diz, Laura é o nome, mas o sotaque galês embrenha toda a cena e deixa-me meio tonto, se calhar é fome, a merenda no avião foi fraquita como se espera. “Onde é que posso comer qualquer coisa” tenho de mudar de sotaque, estou farto que me perguntem se já vivi no states “Aprendi inglês com o cartoon network…” depois de umas palavras que entendi como relativas à importância pedagógica da televisão, lá me respondeu que o melhor seria ir ao outro terminal. Sigo com a Sandra, vive em Washington e diz-me que os Americanos não são assim tão burros, para o meeting point, assim chamado quer tanto esteja no Reino Unido como em Lisboa ou Banguecoque, de encontro a outros internacionais. Percebo quando cá estou a importância de discussões como a dos guettos ou segregação racial aqui, se metade das pessoas que vejo são caucasianas já tenho de olhar com muita atenção. Depois de percorrer com o carrinho da bagagem equivalente á linha vermelha do metro de Lisboa. Quando chego tento fracassadamente ligar o wireless do PC, esquece. Vejo um placar que diz “bite.”. Alto, estão a falar para mim… Enquanto me encaminho para a tão soculenta comida envolta em plástico a Sandra guarda-me as coisas, ela trouxe peras de casa… Com a fome que tenho quase me sinto feliz de largar 1200 paus pela sandocha plástica. Quando regresso já Sandra meteu conversa com uma italiana que vem fazer erasmus e nem a mim me percebe, até sou um gajo de sorte… Seguimos para o autocarro, há uma canadiana que deve trazer 90 quilos de tralha, sem exagero, são 4 sacos como o meu, mais almofada e i-pod. Ofereço ajuda com um deles, (chumbo!!!) perguntando ironicamente se ela vai a casa no natal, “Ya…”. Fico a modos que boquiaberto, mas depois de uma mais demorada observação percebo que de facto ela deve precisar de uns bons quilos de base por dia para disfarçar o acne… A todas as minhas pretendentes, se quiserem ter a mínima hipótese é sinceramente melhor que se tiverem o tipo de tiques de trazer 12 pares de sapatos e uns chinelos de quarto para uma estadia de três meses o disfarcem razoavelmente bem.
Três horas e meia de verde depois chegamos à capital de Gales. A palavra gales queria dizer “estrangeiro” para os anglo-saxões, irónico que a palavra gaélica “Cymru” tenha a ver com amizade. Burocracias e quilómetros depois aterro na minha cama 14 h depois de me levantar dela, são diferentes, muito diferentes, mas são a mesma, a minha. Estou feliz de ter trazido o meu edredão. O quarto é porreiro, quatro metros por três de conforto, quarto de banho incluído. Arrumo tudo, tomo um duche e vou até ao bar da residência, já é muito tarde para ir ás compras. Nada me tinha preparado para o que estava prestes a testemunhar. Enquanto peço uma sandes de frango que vem acompanhada de batatas fritas em forma de espiral e uma caneca de carlsberg é impossível descansar os meus olhos no prato. Nunca antes, por mais arrojado que fosse o local, havia presenciado tanta tensão sexual num só local.
É tão incrível a maneira como as pessoas se olham, que cresce em mim alguma apreensão de que a cena cedo se transforme num bacanal. As miúdas, ridiculamente iguais umas às outras, trajam cintos largos demais, decotes extremos e maquilhagem do molde “Pornstar”. Não consigo deixar de me aperceber que numa qualquer rua de Lisboa 70% delas estaria pronta para o ataque.
A net no cyber onde ensino um tipo cheio de piercigns e um porta-chaves em forma de cabeça do Yoda a tirar uma italiana ainda não está ligada. De qualquer forma ainda não tenho a minha password, “Isso não é problema”, Richard, o colega do “StarWars Maniac”(Ryan) oferece-se para me emprestar a dele. “Este café é mesmo mau…” “Pá não te podes queixar só te cobrámos 50 pences, não fazemos ideia quanto é que custa…” Acho que me vou dar bem com eles, são finalistas, com muita pena, aposto que não se importavam de passar aqui mais uns aninhos, e tomam conta do balcão da secção cyber do bar, uma espécie de lounge sem fumo nem álcool, que fica no primeiro andar, mas também aviam cerveja do outro lado. Volto para o apartamento ainda vazio de outros ocupantes, (pelo menos ainda ninguém se queixou da música) decidido a por a minha papelada em ordem. A meio ouço vozes, são dois indianos com uns amigos, primeiros ocupantes do meu apartamento, fico meia hora a falar de futebol e deixo-os ir descansar do voo directo de Nova Deli. Adormecer é estranho, estas paredes não são minhas, mas amanhã já passou, amanhã passa sempre.
depois de morrer
gostava que um estranho
pudesse olhar a minha vida
e perguntar a quem me conheceu
“-Era maluco?”
e que lhe respondessem sem pudor
“-Um bocadinho.”
sei que algures
uma parte das minhas cinzas
ia esboçar qualquer coisa
como um sorriso.

Barnabé Santiago
20\09\2005

terça-feira, setembro 20

Não digam a ninguém que chorei. É bom sentir que amizades simples, com a despreocupação de fins de tarde e bacardis nos mostram pessoas que são mais do que a vida. Ás vezes apetece-me mudar o mundo. Outras apetece-me só mudar a minha maneira de olhar. Obrigado Chico. Apareceste na minha vida e mostraste-me coisas novas.

http://shitythoughts.blogspot.com/2005/09/medocre-bad-guys.html

Parto amanhã... "Wednesday morning, five o'clock"

"Wednesday morning at five o'clock
as the day begins
Silently closing her bedroom door
Leaving the note that she hoped would say more
She goes downstairs to the kitchen clutching her handkerchief
Quietly turning the back door key
Stepping outside she is free

She (we gave her most of our lives)
is leaving (sacrificed most of our lives)
home (we gave her everything money could buy)
She's leaving home after living alone for so many years (bye bye)

Father snores as his wife gets into her dressing gown
Picks up the letter that's lying there
Standing alone at the top of the stairs
She breaks down and cries to her husband
Daddy our baby's gone
Why would she treat us so thoughtlessly
How could she do this to me

She (We never thought of ourselves)
is leaving (never a thought for ourselves)
home (we struggled hard all our lives to get by)
She's leaving home after living alone for so many years (bye bye)

Friday morning at nine o'clock she is far away
Waiting to keep the appointment she made
Meeting a man from the motor trade

She (what did we do that was wrong)
is having (we didn't know it was wrong)
un (fun is the one thing that money can't buy)
Something inside that was always denied for so many years (bye bye)
She's leaving home (bye bye) "

She's leaving home - The Beatles

sexta-feira, setembro 9

com o passar do tempo fui tentando arranjar motivos
a minha ligação mais que ranhosa
as tardes intermináveis de longboard
as noites longas do baleal
os amigos que querem sempre mais um pouco
a partida apitada (ossos a ranger?)
as decisões impossiveis de saber o que está certo
eu
a minha vida a precisar de reconstrução
um "reboot" a colar-me o estômago ao chão
o amor adiado para horas incertas
mas não.
não acho que tenha sido nada destas coisas, esta é a primeira vez em cinco anos que tenho férias a sério. e não me creio que seja esse o motivo de não ter escrito. não posso ver canetas a deslizar se tudo o que tenho é distrair-me do presente para não pensar no futuro. duas semanas, countdown para uma vida nova. susto. aqui estou, "na véspera de não partir nunca".
eu vou escrever digo eu a mim mesmo, e rio. quem me dera ainda saber mentir-me.

(Vão dar-me uma festa surpresa amanha. Tão enganados, a surpresa já se foi... Festa? Para isso era preciso que eu não fosse para lá chorar... "Tásse bem, agente vê-se" e ás tantas é verdade, não me vou preocupar)