segunda-feira, novembro 28

Ash Wednesday

I

Because I do not hope to turn again
Because I do not hope
Because I do not hope to turn
Desiring this man's gift and that man's scope
I no longer strive to strive towards such things
(Why should the aged eagle stretch its wings?)
Why should I mourn The vanished power of the usual reign?
Because I do not hope to know again

The infirm glory of the positive hour

Because I do not think
Because I know I shall not know
The one veritable transitory power
Because I cannot drink
There, where trees flower, and springs flow, for there is nothing
again

Because I know that time is always time
And place is always and only place
And what is actual is actual only for one time
And only for one place I rejoice that things are as they are and
I renounce the blessed face
And renounce the voice
Because I cannot hope to turn again
Consequently I rejoice, having to construct something
Upon which to rejoice
And pray to God to have mercy upon us

And pray that I may forget
These matters that with myself I too much discuss
Too much explain
Because I do not hope to turn again
Let these words answer
For what is done, not to be done again
May the judgement not be too heavy upon us

Because these wings are no longer wings to fly
But merely vans to beat the air
The air which is now thoroughly small and dry
Smaller and dryer than the will
Teach us to care and not to care
Teach us to sit still.

Pray for us sinners now and at the hour of our death
Pray for us now and at the hour of our death.

T.S. Eliot, 1930



Porque há livros assim, que se abrem em páginas de acaso. E que dão ansias de descobrir. "The Complete Poems & Plays" by T. S. Eliot, Faber and Faber Limited

sábado, novembro 26

posting my own secret


terça-feira, novembro 22

Dou a volta à cama, contornando as colinas das nossas roupas no chão, depois de te afagar os cabelos e te sentir o folêgo pacífico de quem dorme segura. Cada réstia violenta de tecido sussurra as estórias que nos contámos trocando cheiros de champô e vitórias pequenas de cada beijo trincado em conquista. O meu cabelo espalhado pelo ar em volta da minha cabeça. Sei que as tuas mãos existem quando me tocas. Sento-me à secretária, e a tua reprimenda adivinhada leva-me a mão para longe do ritual mágico de enrolar a satisfação de um cigarro. Ascestral como dançar contigo de janela aberta é descascar uma laranja, enquanto sigo a linha das tuas costas, e lhes adivinho as trilhas das minhas unhas sedentas de te ter mais perto. Inalo o odor saudável a suor do meu corpo e sei cada parte dele que é teu, que é nosso de não sabermos os limites dos nossos corpos, e cada instante teu me vem tão intenso como as descobertas lentas e forçadas de cada lábio, de cada mão. As tuas ancas ao som de Nick Cave. Os teus seios nos acordes suaves de Sigur Rós. O teu rosto sereno de êxtase e podia estar a Quinta de Beethoven ou a segunda de Brahms cantada por legiões celestiais, seria ainda só o teu rosto sereno em êxtase, com toda a realidade a descambar para fora do meu corpo reflectido nas tuas feições.
Moves-te num sorriso que não me atrevo a escrever. Lágrima. Devagar aconchegas-te no meu edredon que, cumplice de nós, não te cobre. Ainda bem. Há algo de impossivel nas tuas pernas que me impede de mergulhar na melancolia doce de chorar por te olhar. "Gostava de poder ter uma vida para partilhar contigo." penso enquanto desenho a linha que vai do teu joelho ao teu mindinho, que a minha boca descobriu hoje como um fruto novo para devorar. Se algum dia alguém poder inventar a palavra suave vai inventá-la com as tuas pernas alvas de nórdica. Horas, horas nesta cama. Dias. Estar contigo é como entrar no espaço sem tempo de te devorar o pescoço e não pensar em tudo o que ainda temos de aprender sobre os nossos corpos. O teu corpo. O meu corpo. Os nossos corpos, sem começar nem acabar em nenhum dos lugares onde começam e acabam os nossos corpos. A sincronia que buscamos em cada gesto devagar, para não arruinar o prazer de aprender passo a passo as tuas mãos a dançarem na minha barba por fazer. Quanto mais tempo durar a imperfeição pequenina de ainda não nos tocarmos quando precisamos; quando tens de ter os meus lábios nos teus ou tenho de sentir a tua lingua rodopiar na minha orelha, mais tempo durará a descoberta selvagem e limpida de ter cada momento do outro, cada repiração ofegante e cada dentada estudada. Estaremos satisfeitos quando possuirmos os sabores um do outro até à exaustão dos dedos na pele desse travo.

Sempre mulheres e sempre quartos. Sempre mentiras inventadas no escuro e palavras tiradas das lições de estar só. Mais uma. Tão bela. Tão impossivel de me tocar, na minha frieza, na minha armadura de dar prazer sem esperar nada em troca. Tão só um corpo para descobrir, para dissecar em lugares e suspiros gemidos. E por trás tudo o que sempre pude querer, como sempre. O jeito, a graça, a inteligencia, o sarcasmo. Em ti ainda para mais o saberes, saberes que nunca te vou amar, que vais partir de manhã sem me dizer "Telefona". Que vais partir de manhã e vais dizer "Gostava que pudéssemos ser outros. Gostávamos que pudéssmos querer mais que nos partilharmos e desse-mos as vidas que não temos um ao outro." E a minha resposta vai ser a mesma de sempre. Um beijo de recomeçar tudo de novo, como todas as noites em que vens.

terça-feira, novembro 15

"O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros...

Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentando a pena de teres morrido,
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas muito mais vivo além...
Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...

Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

Encara-te a frio, e encara a frio o que somos..."

Excerto de "Se te queres" - Àlvaro de Campos


Demasiado a frio caro Álvaro, olha que há calor nos homens até chegar a vez de eles serem chorados, e memória se tiverem essa sorte...

terça-feira, novembro 8

a janela aberta
e a chuva lá fora
a deixar entrar
o cheiro a erva molhada
e das gotas
a colidirem com as folhas
e com as asas
dos pássaros pousados
num ar de paciencia
que só a natureza sabe ter
de uns olhos volteando
e ajeitar as penas
aceitando a água
e o verde
e o cheiro da terra
quando o céu
a toca mais
e eu deixo a janela aberta
para molhar as folhas
de papel que me mandaste
e ver a tinta a borrar
as letras de sentidos
perdidos
ou levados pela chuva
como as lágrimas
que teimam em não sair.

Barnabé Santiago 08/11/2005